domingo, 28 de dezembro de 2008

Natale hilare et Annum Nuovo

Um dos maiores oradores de Roma (se não o maior) dizia: “Historia magistra vitae” -“A história é mestra da vida”.
Entra ano, sai ano e as histórias são as mesmas.
Acidentes nas estradas com motoristas alcoolizados.
O congresso em recesso até o mês de fevereiro, enquanto alguns brasileiros sequer puderam passar o Natal com suas famílias.
Guerra no Oriente.
Nos Estados Unidos um homem, vestido de papai Noel, mata oito pessoas.
Enchente em São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro.
Bala Perdida nos morros cariocas, criança atingida. Será que a história é mestra? Será que ela nos ensinou alguma coisa?
Recebi mais de cem mensagens natalinas por e-mail, votos de felicidade, muita alegria no ano que se aproxima, blá, blá, blá, de gente que nem conheço.
Só concordo com uma coisas: no ano que vem tem mais.
Mais corrupção.
Mais criança com fome e frio.
Mais bala perdida.
Mais assalto em farol.
Mais jovens depressivos.
Mais um bando de coisa ruim que acontece todos os anos.
Alguns dirão que sou rancoroso, amargo, mal amado.
Peço desculpas a estas pessoas pela minha raivosidade é que não vivemos no mesmo mundo. Você é a Alice e eu sou Jean Valjean.
Eu gostaria muito de desejar coisas boas para todos, mas não posso, pois meu medidor de hipocrisia alcançou índices maiores que os medidores de chuva da cidade de São Paulo.
Desejar é para o Aladim.
Temos o péssimo costume de colocar para o futuro uma responsabilidade que é nossa, a mudança.
Como esperar que o futuro seja melhor se o presente é uma porcaria. Wake up, não é à toa que o momento em que vivemos se chama presente. É uma dádiva. É o único que pode ser modificado, melhorado, usufruído do jeito que se quer.
O mundo anda tão egoísta que até a ajuda tem que partir de forma individual e própria, não é por acaso que os livros de auto-ajuda (que responsabilidade pra um livro, que pretensão do autor) não param nas prateleiras. É preferível gastar 30 pilas com um segredo qualquer a chamar um amigo pra conversar. E a tendência é piorar, outro dia vi na TV uma moça que dizia ter mais de 5 mil amigos num site de relacionamento, gente que ela jamais poderá abraçar ou pelas quais jamais será abraçada. Conectividade nada, cadê a conexão?
O Natal hoje, serve apenas, para se empanzinar de comida, enquanto os parentes bêbados dançam funk e axé na garagem.Não se esqueça que a menina que escuta funk hoje é a cachorra de amanhã.
Caro amigo eu não desejo nada para você no próximo ano, a história me ensinou que isso não adianta.
Para o próximo ano eu QUERO muitas coisas:
Quero ver as pessoas se conscientizarem que não adianta esperar nada do governo, mas mesmo assim devem cobrar.
Quero ver as pessoas cobrarem dos políticos lisura em seus atos.
Quero que as pessoas não achem assaltos, assassinato de crianças e fuga de presos algo normal, já basta de banalização do crime.
Quero ver as pessoas contra as guerras, entendendo as diferenças e compreendendo as religiões.
Quero ver as pessoas entendendo que o trabalho é perpétuo e o ócio é temporário.
Que ser honesto não é qualidade é obrigação.
Que jeitinho brasileiro não é furar fila, estacionar nas vagas de deficientes, sentar no banco de idosos, ultrapassar farol vermelho, descer do ônibus sem pagar, isso é feio e alguns até crime.
Se isso tudo acontecer no ano que vem, prometo lhe desejar qualquer uma dessas bobagens para 2010, até lá espero que você tenha um ano de trabalho árduo, que todos os lixos jogados embaixo do tapete apareçam, afinal a faxina deve ser completa.
Lá de cima, Jesus Cristo, o motivo de toda essa comemoração não deve estar nada contente com uma bando de gente comendo panetone, bebendo, batendo carros e matando o trabalho e depois dizendo “Natale hilare et Annum Nuovo” – Feliz Natal e Ano Novo.


(O Globo 26/12/2008 -Arnaldo Jabor)

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