terça-feira, 30 de junho de 2009

A Vida

"A Vida"
"Rude, do coração da noite, a vida começa a palpitar" ( Manuel da Fonseca)
Pois sim. É nessa mesma miséria que nasce a vida, aquela dura e sofrida. De tantos Joãos e Marias, aquela também do finado Zacarias e também a de Severino.
Quem nunca ouviu falar em Severino? Aquele mesmo de João Cabral de Melo Neto, e eis que encontro sua face, face-a-face, com a de Fabiano, o Fabiano do Ramos...
Encontrei por umas andanças dessas (aquelas que nos tira a sola do pé e nos faz sangrar até o último suspiro) o Palmas. Fruto do valente confronto de Manuel da Fonseca, de quem roubei uma frase e botei esta mesma como epígrafe dessas linhas tortas e sem nexo algum, pois que a vida é assim mesmo: não tem vírgula.
É num campo moribundo, sem trigo sem céu sem cor, um desses mesmo, que encontrei o Palmas e sua dura vida dura, feito pedra no chão que se agarra às raízes mais profundas do seio da Terra.
Uma raça que resiste, que terá ainda o direito ao grito, diria minha bela professora da vida, a Lispector.
Grandes palavras, mas pouco feitos.
E por que não convidar para essa insólita passagem os meninos do trapiche? Eita Jorge Amado, não muito amado, agora bem mais sexualizado, mas valente. A miséria transforma o homem. A miséria de uns é a riqueza de outros. Justiça? Não creio nessa hipócrita palavra, não na nossa, a dos homens, a de Deus tem valia, mas no coração dos honestos.
Me lembrei também do bicho-homem do Bandeira. E pergunto pra quê o susto? João Melo (este angolano) também diz que lá por Luanda e seus arredores tem muitas cestas de lixo e ratos e sujeira e homens. Filhos da dor e da fome.
Valentia de quem escreve a vida tal como ela é e não com flores e doces.
É um gemido aterrorizante que fica zumbindo no ouvido da gente, é uma dor sem tamanha: é a vida seca, que tem cactos e ossos, magro boi morto e um seara de vento.
É a vida meu Deus! Nesse mundo de meu Deus, quem come é rico, quem trabalha é rei.
Mas quem vive, quem vive mesmo esta teimosa vida é quem pode dizer: é no lodo que mora o lírio, é da lama do mangue que brota a vida, é da seca que nasce o homem.
"Rude, do coração da noite, a vida começa a palpitar"
Paula Cristina

segunda-feira, 29 de junho de 2009

El poeta dice la verdad

Quiero llorar mi pena y te lo digo
para que tú me quieras y me llores
en un anochecer de ruiseñores,
con un puñal, con besos y contigo.

Quiero matar al único testigo
para el asesinato de mis flores
y convertir mi llanto y mis sudores
en eterno montón de duro trigo.

Que no se acabe nunca la madeja
del te quiero me quieres, siempre ardida
con decrépito sol y luna vieja.

Que lo que me des y no te pida
será para la muerte, que no deja
ni sombra por la carne estremecida

Federico García Lorca

terça-feira, 23 de junho de 2009

Intuição

Canta uma canção bonita
Falando da vida em ré maior
Canta uma canção daquela
De filosofia
É mundo bem melhor...

Canta uma canção que agüente
Essa paulada e a gente
Bate o pé no chão
Canta uma canção daquela
Pula da janela
Bate o pé no chão...

Sem o compromisso estreito
De falar perfeito
Coerente ou não
Sem o verso estilizado
O verso emocionado
Bate o pé no chão...

Canta o que não silencia
É onde principia a intuição
E nasce uma canção rimada
Da voz arrancada
Ao nosso coração...

Como, sem licença o sol
Rompe a barra da noite
Sem pedir perdão
Hoje quem não cantaria
Grita a poesia
E bate o pé no chão...

Canta uma canção bonita
Falando da vida em ré maior
Canta uma canção daquela
De filosofia
É mundo bem melhor...

Canta uma canção que agüente
Essa paulada e a gente
Bate o pé no chão
Canta uma canção daquela
Pula da janela
Bate o pé no chão...

Sem o compromisso estreito
De falar perfeito
Coerente ou não
Sem o verso estilizado
O verso emocionado
Bate o pé no chão...

Canta o que não silencia
É onde principia a intuição
E nasce uma canção rimada
Da voz arrancada
Ao nosso coração...

Como, sem licença o sol
Rompe a barra da noite
Sem pedir perdão
Hoje quem não cantaria
Grita a poesia
E bate o pé no chão
E hoje quem não cantaria
Grita a poesia
E bate o pé no chão...

Sem o compromisso estreito
De falar perfeito
Bate o pé no chão
Sem o verso estilizado
O verso emocionado
Bate o pé no chão...

Canta uma canção bonita
Falando da vida em ré maior
Canta uma canção daquela
De filosofia
Do mundo bem melhor
Canta uma canção que agüente
Essa paulada e a gente
Bate o pé no chão...

E hoje quem não cantaria
Grita a poesia
E bate o pé no chão...

Oswaldo Montenegro

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Guernica

Francisca Júlia, grande poeta!

“Assim, num dia assim, a morrer sem alarde,
chorando eu disse adeus e ele partiu chorando,
para renascer na Terra onde estarei mais tarde...”

sábado, 13 de junho de 2009

Madrugada ensolarada

Ontem acordei e não pude ver a lua
ela já tinha caído no mar!

Na hora de dormir dois sóis estiveram a brilhar o tempo todo
E quase não se via os caramujos no céu!

A madrugada estava linda
Um sol perene a banhava
com uma chuvinha de leve-leve

Tudo era tão bonito!

E então vieram as leis...
Remexeram e mexeram
Deixaram o mundo como está:

Sem sonho

Hoje acordo e vejo prédios.
Na hora de dormir o único brilho é o dos postes.
A madrugada é barulhenta e odiosa.

Não sou mais poeta.
Sou uma imagem inventada de poeta.
um poeta cheio de cinzas.
e sem graça.
um poeta que perdeu a alma.
que perdeu a lua.
que perdeu o sol.
que perdeu a madrugada.
que perdeu o encanto.

Fr ag me nt ad o


Paula Cristina

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Vinicius de Moraes


"Para Viver Um Grande Amor"

Vinicius de Moraes


Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher... — não tem nenhum valor.

Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado pra chatear o grande amor.

Para viver um amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe amor sem fidelidade — para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.

Para viver um grande amor, il faut além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito — peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais que na modista! — para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...

Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs — comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor?

Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor.

É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao diz-que-diz-que — que não quer nada com o amor.

Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva oscura e desvairada não se souber achar a bem-amada — para viver um grande amor.


Texto extraído do livro "Para Viver Um Grande Amor", José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1984, pág. 130.


quinta-feira, 4 de junho de 2009

Mãe é Mãe!

Imagens valem mais do que palavras!